Ainda que um casal tenha se separado judicialmente, o seguro de vida de um dos ex-cônjuges deve ser pago ao outro, em caso de morte, caso não tenha havido mudança no contrato. Por isso, a 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul reformou sentença que julgou improcedente a liquidação de sinistro feito pelas filhas de um aposentado após a morte da ex-mulher dele.
O homem aderiu facultativamente à “cláusula automática de inclusão de cônjuge” numa apólice de seguro de vida, de modo que, em caso de morte de sua mulher, ele ou alguém que ele indicasse seria beneficiário do capital segurado.
Na vigência do contrato, o casal se separou judicialmente, mas não chegou a se divorciar nem a constituir novo matrimônio ou união estável. A seguradora teve ciência destes fatos, assegurou o autor da ação, tanto que ambos mantiveram a “cláusula cônjuge”. Após mais de uma década, a mulher morreu, e as filhas do homem abriram um “aviso de sinistro”, requerendo o pagamento de indenização securitária.
A seguradora indeferiu administrativamente o pedido, argumentando que o caso não se enquadrava nas condições gerais do contrato, em razão da separação do casal. Mesmo diante da negativa de pagamento do capital segurado, a seguradora continuou cobrando o prêmio de cobertura securitária, feita diretamente no contracheque do autor.
Sentença improcedente
A juíza Nara Elena Soares Batista, da 13ª Vara Cível do Foro Central de Porto Alegre, deu razão à parte ré. A seu ver, a separação judicial extingue a sociedade conjugal, pondo fim aos deveres de coabitação, de fidelidade recíproca e ao regime de bens, conforme prevê o artigo 1.576 do Código Civil. Assim, sem sociedade conjugal, ambos não seriam mais cônjuges, na acepção do termo, há mais de 12 anos.
A julgadora destacou que a ré só teve ciência da separação judicial do segurado quando requisitada a pagar a indenização securitária. Tal conduta, segundo ela, fere o artigo 765 do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90). Pelo dispositivo, segurado e segurador são obrigados a guardar, na conclusão e na execução do contrato, a mais estrita boa-fé e veracidade, tanto a respeito do objeto como das circunstâncias e declarações a ele concernentes.
“Nesse sentido, o autor não demonstrou ter informado à requerida [seguradora] sobre a separação judicial, não bastando para tanto a alegação de que a averbação da separação judicial é pública ou de que manteve seus dados atualizados perante o empregador (…), pois este é pessoa jurídica diversa da requerida. Por isso, a alegação de que os descontos relativos à cláusula suplementar contratada continuaram a ser realizados após a separação judicial também não é motivo para o acolhimento da demanda”, fulminou na sentença, julgando a demanda improcedente.
Virada no tribunal
O relator do caso, desembargador Luís Augusto Coelho Braga, teve entendimento diferente e aceitou a apelação do autor, sendo seguido pelos demais integrantes da 6ª Câmara Cível. Para Braga, a leitura atenta do artigo 1.571, inciso III, do Código Civil, revela que a separação judicial não põe fim ao casamento, mas apenas à sociedade conjugal. “Assim sendo, evidente o direito invocado na inicial, já que o autor, apenas separado judicialmente, apresentava-se, à época do falecimento da segurada, ainda como verdadeiro cônjuge desta”, complementou no acórdão.
Em reforço de sua convicção, o relator constatou que o autor não foi informado sobre a existência de cláusula restritiva de direito; ou seja, de que a superveniência da separação judicial do casal implicaria na perda de seu direito em relação ao contrato firmado. Ainda: observou que a seguradora sequer apontou a mencionada cláusula, o que implica presumir que ela não existia de fato.
“Neste passo, não há como aceitar as limitações securitárias impostas pela parte ré, sobretudo porque o pagamento do prêmio com a manutenção das mesmas cláusulas contratuais e indicação do beneficiário permaneceram incólumes após a dissolução da sociedade conjugal em questão”, diz o acórdão, do último dia 11.
Fonte: Conjur