Fonte: Felippe Moreira Paes Barretto – ANS

Um profissional, renomado cirurgião cardíaco, ao realizar delicada cirurgia, deparou-se com a ocorrência de fibrilação atrial, intercorrência passível de ocorrer e amplamente descrito na literatura médica, a qual se indica o uso de desfibrilador para que o evento cesse e a cirurgia possa evoluir.Ocorre que ao manusear o aparelho e iniciar a conduta de desfibrilação, percebe que o mesmo está descarregado, não sendo possível reverter o quadro tempestivamente, evoluindo o paciente com complicações e posterior óbito.

Tal fato, infelizmente, ocorre com certa frequência, já que a modernidade trazida por equipamentos e instrumentos de ponta acarretou aos profissionais e instituições de saúde maiores responsabilidades, pois é obrigatório terem a plena consciência dos benefícios e prejuízos destes novos recursos, devendo, preventivamente, analisar cada risco e determinar a melhor forma de preveni-lo.

Pequenas ações tais como a manutenção preventiva de equipamentos e treinamento dos funcionários são medidas simples que se mostram eficazes. Assim, como um piloto de avião, que deve fazer inúmeras checagens antes de decolar, todo profissional da saúde, antes de iniciar qualquer procedimento também deve verificar diversos pontos, tais como: confirmar o nome do paciente, confrontar o nome da droga prescrita e a que está manipulando, verificar se os equipamentos da sala, incluindo o foco de luz,o bisturi elétrico ou o desfibrilador estão em adequado funcionamento.

Apesar dos profissionais envolvidos serem obrigados a realizarem tais checagens, a medicina fastfood acaba por coibir suas realizações. Assim, é de extrema importância que os estabelecimentos de saúde promovam mecanismos para reduzir as fontes de riscos, abrangendo cuidados com pacientes, funcionários e acompanhantes, bem como os recursos e patrimônio da respectiva instituição.

Vejamos abaixo, alguns trechos de decisões judiciais onde houve a condenação justamente pela ausência de cuidados básicos no gerenciamento de risco:“Autora foi internada para realização de cesárea e recebeu alta com queimadura na região dos glúteos – Laudo pericial devidamente fundamentado – Dever do médico de acautelar-se sobre o bom funcionamento do aparelho (…)” –TJSP Relator: Luiz Antonio Costa; Comarca: Diadema; Órgão julgador: 7ª Câmara de Direito Privado; Data do julgamento: 14/05/2015; Data de registro: 14/05/2015.

Defeito no funcionamento de aparelho indispensável à realização do procedimento cirúrgico Negligência por parte do hospital ao não verificar previamente o perfeito funcionamento do aparelho (…)” – TJSP Relator: Paulo Eduardo Razuk; Comarca: Suzano; Órgão julgador: 1ª Câmara de Direito Privado; Data do julgamento: 25/02/2014; Data de registro: 28/02/2014.

Nota-se que muito dificilmente consegue-se reverter decisões condenatórias tão categóricas, as quais demonstram a ausência de verificações básicas que geraram danos ao paciente. Possivelmente, a discussão, em sede de recurso, será tão somente na tentativa de se reduzir a condenação imposta.

Vale ressaltar que além das implicações acima descritas, a ausência de gerenciamento de risco também acarreta grandes impactos securitários, tal como a elevação do risco e consequente valor de reserva a ser feito pelas companhias ao receberem um sinistro de tal natureza.

Assim, diante do exposto, não restam dúvidas que o fortalecimento da cultura de gerenciamento de riscos profissionais dos estabelecimentos de saúde contribui sobremaneira para diminuição dos danos físicos e morais dos pacientes, como também mantém o equilíbrio financeiro das instituições e dos envolvidos nesta cadeia.

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